08 maio 2008

Jornalismo de referência


Esta semana um grande amigo meu, também jornalista mas de outra publicação, questionava se o DN continuava a ser um jornal de referência. Isto depois de termos falado sobre o aumento de vendas do DN, que ultrapassou o Público, após seis anos. Ele dizia aquilo que alguns dizem sem pensar e, sobretudo, sem analisar devidamente a questão: que o DN pertencia agora ao segmento dos jornais populares, tendo deixado de ser de referência e que o Público estava no seu segmento sozinho. Nada mais disparatado. No que toca ao aumento de vendas do DN, que ele também questionava a sua veracidade (como se o DN pudesse mentir sobre os números. Não é o jornal que os fornece. Além disso são auditados da mesma forma para todas as publicações...), é fácil explicar a subida rápida em apenas um ano: competência.

Basta comparar o DN do início de 2007, ainda liderado por outro director, e o DN dos dias de hoje, liderado por João Marcelino, e reparar nas abissais diferenças. Uns dirão: "sim, agora dão crimes". E é verdade. E ainda bem que o DN noticia crimes, também eles fazem parte do nosso quotidiano. Mas além de crimes o DN dá notícias suas, tem os jornalistas nas ruas a fazer reportagens, outros fazem investigação, tem excelentes entrevistas e ainda marca a agenda nacional com as suas manchetes. Pouco ou nada disto acontecia no início do ano passado. O DN há pouco mais de um ano era irrelevante e por isso não era comprado. (Quem esteja a ler até pode pensar: "bem... este gajo deve estar a dar graxa ao director". Falso! O director não sabe quem é o autor deste blogue e que eu saiba nem o lê.) Como todas as pessoas que carregam nos "R", João Marcelino é inteligente e, saindo do Correio da Manhã, obviamente, não iria criar um outro CM no DN. Colocou a sua experiência (de vencedor) ao serviço do mais antigo jornal generalista nacional. Colocou os jornalistas nos lugares certos, fez mudanças editoriais e, sobretudo, lançou novos produtos dentro do próprio jornal. E tem outra vantagem: trabalha no jornal. Não está quase todos os dias a fazer de comentador num canal noticioso, como acontecia anteriormente, e que levou o DN à irrelevância. Aliás, com os louros que hoje estão à vista de toda a gente: chegou a director televisivo...

Por outro lado, os jornalistas do DN são maioritariamente os mesmos que estavam antes da sua entrada na empresa. Os tais que o meu amigo achava de referência antes de Marcelino e que agora acha populares depois da entrada de Marcelino. Nenhum eles mudou a sua forma de escrever. Sim, porque as notícias não são populares ou de referência. A forma como se escreve, e é apresentada, é que pode ser popular ou de referência. E isso não mudou. Por vezes cometem-se erros? Claro que sim, todas as publicações os fazem. Às vezes é inevitável num jornal diário e feito lutando contra o tempo. Mas comparem o DN de Janeiro de 2007 e o de agora. Vejam as secções, analisem as reportagens, os temas destacados, a quantidade de notícias dadas, as rubricas, a opinião. O DN ganhou vida. É hoje um jornal muito mais bem feito do que era. Ganhou suplementos como o DN Sport, o DN Gente e aproximou os leitores do suplemento de Economia, agora chamado de DN Bolsa. E ainda aumentou o jornal de domingo para 80 páginas com rubricas completamente originais. Nas revistas criou a DN Televisão, hoje Notícias TV, melhorou as revistas Notícias Sábado e Notícias Magazine. Em pouco tempo haverá um site do DN renovado e novos suplementos deverão estar na calha. Em apenas um ano, mudou quase tudo... e tudo feito utilizando a "prata da casa". O homem é um génio? Não sei. Sei que o panorama da imprensa portuguesa ganhou porque tem um DN mais forte e competitivo no mercado.

E isto é apenas o princípio. O mais antigo jornal de referência do País será, cada vez mais, também o jornal da preferência dos leitores portugueses. Não tenho a menor dúvida. Quanto ao Público... penso que perdeu o gás depois da última renovação gráfica. Deixou de dar verdadeiras manchetes que marquem a agenda nacional, menosprezou as secções Media e Desporto, ficou cinzento (apesar de ter cor nas suas páginas) e atirou uma das suas imagens de marca para o fim do jornal: a Opinião. Depois tem um director conservador e uma redacção progressista, o que dá azo a todo o tipo de incongruências editoriais. Graficamente ficou confuso e o leitor já não sabe onde encontrar o quê... Salva-se o suplemento P2, que mesmo assim é muito irregular. Ainda assim é um bom jornal, onde se encontram alguns artigos interessantes e com alguma profundidade. Pena que tenha deixado de inovar e surpreender. Está a ficar um resumo do que as televisões deram no dia anterior, à semelhança do Expresso, que resume nas suas páginas os acontecimentos da semana (talvez por isso, a Visão já seja o semanário mais lido pelos portugueses...). Mas como em tudo, é uma questão de hábito. As pessoas compram o Expresso porque se habituaram a fazê-lo, nem vêem a primeira página. E é também isso que vai salvando o Público... É isso a referência?

4 comentários:

Anónimo disse...

Há três anos, na Meios & Publicidade, João Marcelino, então director do Correio da Manhã, dava uma entrevista de capa: "Há quem se diga de referência, eu prefiro ser um jornal de preferência".
A frase, muito mais do que uma "boutade", é um manual de sobrevivência e a chave do sucesso: o homem é assim. Desempoeirado, prático, pouco consensual, pragmático, directo ao que interessa.
Quando chegou ao DN, disse aos seus jornalistas: "Quero um jornal de notícias". E é isso que o DN é hoje. E, por isso, deixou de ser dispensável. E, por isso, subiu tanto nas vendas (números oficiais e auditados pela Associação Portuguesa de Controlo de Tiragens, não é propriamente "um numerozinho-trinta-e-um-de-boca"...).
Bem pode o Público (ou alguns dos seus profissionais, porque conheço outros tantos que estão bem preocupados com o estado do jornal e que têm olhos na cara...) passar a mão na barriga, bocejar, recostar-se na cadeira e achar que "o DN já não é do nosso campeonato". Nisto como noutras coisas na vida, o pior cego... é sempre o que não quer ver!

Anónimo disse...

vamos rectificar alguns disparates aqui escritos:
nunca disse que o DN tinha adulterado os números das vendas - disse que o Público (e todos os outros) tinham manipulado os números. O Tiago acha que houve um surto de leitura nos portugueses e todos - TODOS - os jornais dispararam nas vendas. Isto, contrariando todas as tendências que dão a imprensa escrita em queda... Foram os apetites de 208...
Passado este ponto que não tem discórdia - toda a gente percebe que os jornais estão em crise e um salto de quase 70 mil leitores diários no conjunto de todos os jornais é de desconfiar: basta pensar um pouco.. lol
a outra coisa tem a ver com o Público. Não sei quem é a alminha que escreve o comentário a este post, mas de certeza que nao sabe do que fala. O que disse ao Tiago foi que o Público está sozinho no segmento. Mais um facto irrefutável - o DN, goste-se ou não do Marcelino - segue-lhe o pulso e como em tudo o que ele alguma vez dirigiu na vida, virou popularucho. Não tem mal nem vem daí vergonha ao mundo. Mas refutá-lo é de quem se mostra envergonhado (incomodado) com esse facto. O percurso é sabido: Record, CM e DN. O jornalismo de "preferência" dá vonta de rir: o Record nunca ultrapassou a A Bola; o CM sempre andou de mão dada com o JN; e o DN está longe da sua concorrência, leia-se CM/JN...
O Público não está bem, cheio de problemas e em crise. Há vários anos (muitos, desde a sua nascença, diga-se). O que nunca lhe retirou o título de melhor jornal do país.
Sou leitor, e o Tiago sabe disso, do DN há 15 anos (da coluna do Vitor Cunha Rego...). E do Público há outros 15. E sempre comentei o bom e o mau, os altos e baixos, dum e doutro jornal.
Não gosto do actual DN - ja seguia o Hortelao e a Filomena no Record e depois no CM. Bem como o Marcelino... enfim. E as vezes dou por mim a não saber se li a notícia no CM ou no DN, tal é a confusão e a semelhança de estilos (o novo grafismo do CM vem deixá-lo de cara igual ao JN). Ou seja, 3 jornais quase iguais...
Isto nao apaga a crise do Público mas, e como ouvi dizer que o JN vai pôr uma senhora com as maminhas ao léu na penúltima pagina, prefiro andar calmo nestas águas turvas e esperar por melhores ventos.
As capas com ciência e os P2 desta vida têm pouco sucesso, mas têm o seu lugar.. Vamos ver até quando, mas até lá é lutar...

fel

post - não visto a camisola de nada. fui crítico com o meu professor de faculdade, pivot do jornal nacional da TVI e q defendia aquele tipo de jornalismo. Eles continuam líderes destacados nas audiências. Em minha casa é raro descer da SIC-Not...

TG disse...

Sim, realmente dar grande destaque ao cigarro do primeiro-ministro no avião é cá de uma referência. Foi giro ver o Público a fazer o mesmo que o 24 Horas e e Correio da Manhã. O Público é o melhor jornal do País? Essa deve ser para rir. Já foi sim... mas isso foi em tempos.

Anónimo disse...

É verdade que os jornalistas se pelam por uma boa polémica. Eu adoro, confesso. Além disso, o essencial do jornalismo é só um: factos. Vamos a eles. O "anónimo", se quiser, que venha atrás:

1. "o Record nunca ultrapassou a A Bola", diz. Não é verdade. Como sabes (?), as vendas de A Bola não são auditadas pela APCT (uma velha e longa polémica, nunca resolvida na Travessa da Queimada...). O único dado disponível para serem tão afirmativo é comparares o Bareme de Imprensa da Marktest. É só uma questão de pesquisares e verás como, nos idos de 1999 a 2003, o Record em várias vagas ultrapassou A Bola. Quem era o director? Marcelino.

2. "O CM sempre andou de mão dada com o JN", diz o "anónimo". Lamento, mas não é verdade. Até 2003, o JN era o jornal mais vendido no país, à frente do Correio da Manhã. Foi a partir daí que o CM se tornou campeão de vendas - dados APCT. Quem era o director? Marcelino.

3. "O DN está longe da sua concorrência, leia-se CM/JN...". Concorrência pressupõe mercado. E o mercado, estreito por sinal em Portugal, tem cinco diários generalistas. Todos concorrem com todos. Todos querem vender. Mas mesmo indo ao encontro do que pretende o "anónimo" (longe da concorrência do CM/JN)... lembro que há um ano quando o Marcelino chegou à Avenida... o DN vendia em banca 25 mil exemplares. Hoje vende 40. Longe da concorrência? Sim, mas bem menos longe. Ah, claro, e à frente do Público...